domingo, 24 de abril de 2011

Por Baixo dos (poucos) Panos[...]



Se canto sou ave, se choro sou homem
Se planto me basto, valho mais que dois
Quando a água corre, a vida multiplica
O que ninguém explica é o que vem depois...

Ney Matogrosso quando ainda pequeno, escolheu o caminho do questionamento, das reticências do mundo adulto, inconformando-se com seus preconceitos e incoerências... Teve a infância e a adolescência marcadas pela solidão, em parte voluntária - gostava de passar horas seguidas no mato, acompanhado somente por seus cachorros... Em 1966, no Rio de Janeiro, passou a viver da confecção e venda de peças de artesanato em couro, adotando completamente a filosofia de vida hippie. Em 1973 integrou no grupo Secos e Molhados, onde após gravar dois discos em 1974 começou seu trabalho solo.
Ney já possui 34 discos cheios de poesia, expressão artística, opinião critica e performances enaltecedoras.
Uma entrevista curta onde pode-se conhecer um pouco sobre suas idéias:


Ney Matogrosso é expressamente criticado pelas poucas roupas que usa em seus shows, pelas performances realizadas e por suas opiniões sinceras, o que passa despercebido é arte, a poesia e a relação quente e fiel que possui com seu público. para quem ainda não se deliciou de suas obras vale muito a pena assistir sua regravação de Balada do Louco, onde além de ser um ato de expressão é também uma interpretação emocionante:
http://www.youtube.com/watch?v=XUXwBQnyEZw&feature=related

O som vem de dentro da alma, e toma forma de música através da voz.
A expressão traz a identidade do artista.
Ritmos que acompanham a voz. Sons que movem o corpo.
Torna claro. Marca o escuro. Vermelho, verde e azul. Branco.
As cores no palco iluminam a cena e alimentam o som.
A testemunha da criação, a quem se destina o espetáculo.
Quem compartilha o segredo que é aberto, em uma entrega.
Que se despe, e se torna cúmplice.

(Info. Extraídas do Site Oficial)

O TEMPO DAS COISAS


Ana Jácomo (1966) é carioca, formada em Jornalismo. O estilo predominante em seus textos é a prosa poética. Na década de 90, participou com contos e crônicas das antologias. Em 2001, lançou um livro independente intitulado “Parto de Mim”, impresso na Fábrica de Livros da SENAI. Apaixonada por música, desde sempre, no finalzinho de 2006 começou também a percorrer o caminho da composição musical. Gosta de dizer que escrever é o seu trabalho mais lúdico. Seu jeito preferido de prece. Sua maneira predileta de levar o coração para pegar sol.

Um pouquinho dessa poesia libertadora e por que não terapêutica:

O tempo, de vento em vento, desmanchou o penteado arrumadinho de várias certezas que eu tinha, e algumas vezes descabelou completamente a minha alma.
Tudo o que eu vivi me trouxe até aqui e sou grata a tudo, invariavelmente. Curvo meu coração em reverência a todos os mestres, espalhados pelos meus caminhos todos, vestidos de tantos jeitos, algumas vezes disfarçados de dor.
Algumas sementes simplesmente não vingam e isso não significa que a vida, por algum motivo, está se vingando de nós.
Poderíamos, mais vezes, tentar respeitar os dias e as noites das coisas, os sóis e as luas de cada uma, os amanheceres, os entardeceres, as madrugadas, a sabedoria reparadora e tecelã dos intervalos, as estações todas com seus jeitos todos de dizer. Percebermos, mais vezes, a partir da nossa própria experiência humana, que tudo o que vive, queira ou não, está submetido à inteligência natural e engenhosa das fases. Dos ciclos. Da permanente impermanência. Da mudança.
Mas, não. A crisálida ainda está se acostumando com a ideia de ser borboleta e já queremos que voe. A flor ainda é botão e, em vez de apreciá-la como botão, ficamos apressados para vê-la desabrochada. O fruto ainda precisa amadurecer, mas o arrancamos, verde, do pé, por mera ansiedade. Ainda é a vez do tempo estar vestido de noite, mas queremos que se troque rapidinho para vestir-se de manhã.
Nossa impaciência, nossa pressa àvida pelo resultado das coisas do jeito que queremos, no tempo que queremos, geralmente altera o sábio fluxo do tempo da vida e o desdobramento costuma não ser lá muito agradável. Não é raro, nós o atribuímos à má sorte, ao carma, ao mau-olhado. Não é raro, culpamos Deus, os outros, os astros, os antepassados. Não é raro, é claro, nós ainda nos achamos cobertos de razão.
Sabor é o presente. Saber é quando a gente desembrulha.
Os fios grisalhos da cabeleira também menina da minha alma dizem um viço que acende a vontade dos encantamentos de verdade. De verdade, entenda, é quando o encantamento realmente faz a gente sorrir.
Como deve acontecer com outros tantos aprendizes da coragem, às vezes, cansadíssima das lições e do método pedagógico, eu recordo que a covardia, pelo menos na aparência, é bem mais fácil, bem menos trabalhosa, e, claro, bem mais egoísta, eu já estive lá com muito mais frequência. Mas aí, justo neste ponto, costuma acontecer algo bem bonito: também recordo de cada flor que veio à tona só porque tive coragem de cuidar da semente. Só porque não me acovardei, mesmo que tantas vezes com todo medo do mundo.

(Foto de Ushi Arakaki/ Registros do Japão)